quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

A sala amarela

-Querida, vê aquela pequena entrada ali? É no fim do corredor, sala 30.
A menina então, cheia de dúvidas, se dirigiu à pequena porta, que dava entrada para um longo corredor de agonias.
Porém, ainda em angústia, não estava sozinha. Aliviava as suas aflições alma caridosa que a acompanhava.
Logo foi atendida, mas sempre direcionada a uma sala, e outra sala, e outra sala. "É só aguardar", diziam. E ela aguardava. O que mais faria?
Após imenso e indiscreto questionário, se dirigiu a outra sala, onde lhe colheram o sangue com agulha também indiscreta. Não fez sequer qualquer espécie de careta. E logo foi mandada a outra sala.
Aguardou mais um pouco, um pouco mais aflita. Chamaram-lhe o nome e ela foi saber o veredito.
Enquanto isso, a alma caridosa não fazia nada além de esperar, naquela débil sala amarela.

domingo, 26 de agosto de 2012

Fôlego

No ouvido, uma reprodução aleatória. Ao seu redor, puro silêncio. Talvez não puro, ouvia-se os ruídos do parque, as respirações alheias, os passos rápidos e o voar do vento. Puro mesmo era o silêncio de dentro. Dentro de si, nada se ouvia. Ao mesmo tempo, o desespero era gritante.
Corria sem ter onde chegar. Sem ter um foco no olhar. Só corria, e corria, e corria. Seus joelhos fraquejavam e, ainda assim, corria. Corria como se fugisse de alguém, e fugia. Fugia de algo, fugia do mundo, fugia de todos. Fugia mesmo era de si.
Mas de si não se foge, mesmo se quiser. E gritava, sem emitir nenhum som. Gritava tão alto e nada se ouvia, ninguém ouvia, ninguém queria ouvir. 
O vento batia contra o seu rosto, o suor escorria por suas têmporas, o batimento cardíaco rápido e a respiração ofegante. Seus frágeis joelhos já não aguentavam. E corria, corria, corria cada vez mais rápido, e jamais chegava onde queria. Onde queria? 
Seu rosto já se avermelhava como o sol de fim de tarde. Sua boca já não se umedecia por nada no mundo e suas bochechas queimavam de tão quentes. Suas pernas formigavam.
Seu ritmo ralentava aos poucos, como que cedendo ao que o corpo pedia. Suas pernas começavam a bambear, cessando o movimento. Seus braços iam cedendo. O peso. Para baixo. Seus ombros relaxavam-se, gradualmente. Logo, parou. Respirou. Recuperou. O. Fôlego. Apoiou. As mãos. No joelho. E então. Colocou-as. Na face. E chorou.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Breve (re)caída

E mais uma vez, a queda é brusca. Mas não mais machuca como antes.
A verdade é que quando se cai muitas vezes, se aprende a cicatrizar.
O lado bom da história é a carcaça que aprendemos a criar.
Não sentir, no entanto, é o que realmente me apavora.
Nessa vida de sentidos, não sobrevive quem não chora.
Força, palavra que não se resume em não chorar.
Engloba, porém, tudo o que se sente sem desmoronar.
Cai, cai, balão. Cai longe daqui, que aqui não é bem-vindo.
Cai, cai, balão. Cai, cai, cai, cai, cai, cai, mas levanta e vai seguindo.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Aliteração

Sempre sinto e, na insônia, vem o sonho, um tanto simples e sereno, como o semblante que me circunda a face sólida e some pelos ares secos que me cercam.
Na cidade suja e insalubre, sou e sonho sem sempre saber o que sinto ao certo, e por isso, desatino e sento e solto o que me surge em qualquer modo de dizer.
Escrevo e creio que o alívio cresce, sem querer. Logo volto a ser quem não sei descrever, mas querendo saber, crio o conflito que em mim entra e atrapalha, e me troca a lucidez pelo que não se quer saber. O que se passa na insanidade?
Sinto, logo escrevo. Escrevo e volto a ser.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Brisa, brasa, breve

Foi-se. Foi-se antes de ir. Por medo de ficar é que partiu.
Partiu porque não poderia ficar.
Fez-se longe antes da hora. Para a lógica apelou.
Pra que ficar se vou-me embora? Por que amar se sei que vou?
Vou-me logo e para longe. Vou e volto não sei quando.
Quero ir, mas não deixar. Quero ser sem estar amando.
Antes partir do que apegar. Melhor pegar e depois ir.
Pra que ficar se sei fugir? Por que sentir se vou deixar?
Pensando assim é que se foi. Assim que foi, ela chorou.
Fechou-se dentro e se calou. Sofreu calada e se isolou.
Como sofrer sem me exaurir? Por que frustrar e não florir?